terça-feira, 19 de agosto de 2014

Experiências de um Enecom

Por Arthur Nóbrega


Nos dias 19 a 26 de julho ocorreu na Universidade Federal de Alagoas (UFAL) o Encontro Nacional dos/as Estudantes/as de Comunicação Social (ENECOM) com o tema: Educação às Avessas: da Formação que temos à Comunicação que queremos. A programação desse evento consistia desde palestras, oficinas, minicursos, manifestação a núcleos de vivências em comunidades ribeirinhas, vila de pescadores/as e projetos sociais em Maceió, entre outros.

Dentre as atividades, fui convidado para compor uma mesa de discussão sobre Diversidade Sexual e Educação. Dentro do tema proposto pelo evento, me propus a problematizar a concepção educacional que possuímos correlacionando com a postura política, sobretudo, a de combate à homolesbotransfobia, racismo e machismo, isto é, considerando Educação como política e vice-versa.

A partir disso, com mais intenção de tornar frágeis as certezas do que consolidar alguma resposta em definitivo, denuncio a necessidade de (re)inventarmos a Educação e a Política, frente à subrepresentatividade, pois em ambos os campos de poder, LGBT’s, mulheres, negros/as não são, ao todo, bem queridos/as. Assim, o educar, o fazer ciência e estar inserido/a nas decisões políticas precisam ser modificadas.

Foto:  Kelvin Yule
Nessa perspectiva, me apoio na crítica epistemológica levantada pela perspectiva queer, em especial às levantadas por Judith Butler, e a noção de poder do francês Michel Foucault. A quem serve o seu discurso? Eu perguntava aos/às encontristas. De que lugar vocês falam? Insistia!

A quem a ciência positivista serve? Que relações de poder escondem dentro de seus métodos e do modo de produzir saber científico? Talvez essa seja a questão central de minha fala naquele dia. Foucault já alertava sobre o saber/poder da ciência e o perigo de estar dentro da ordem do discurso.

Relaciono, portanto, o educar, politizar e cientificizar à alteridade antropológica. Há a necessidade de saber o local de nossa fala e reconhecer o do/a outra/a, com seu campo de significações, leituras do mundo e sua lógica de tornar o mundo legível. Assim, qualquer tentativa de homogeneizar e hierarquizar visões sociais e culturais, nesses campos de saber/poder é postura etnocêntrica.

Nesse sentido, problematizei o fazer Ciência, Educação e Política pensando a lógica binária, heteronormativa, que busca uma neutralidade axiomática. Isto é, pedir a retirada de trajetórias de vida e suas leituras valoradas do mundo não é tornar esses três campos inumanas? Ser humano/a não envolve o sentir, o significar?

Foto: João Santana
(In)concluo a fala naquele evento, seguindo a (i)lógica proposta nas reflexões, alertando que comunicar é se posicionar no mundo, participar dele, inclusive politicamente e educacionalmente. Assim, pessoalmente e situado num lugar de um estudante de ciências sociais por uma Universidade pública, branco, gay, cisgênero, sem deficiência, que façamos comunicação, ciência, política e educação mais afetiva, humana, não-binária e considerando a alteridade como primordial para equidade e justiça social.

Que nós, estudantes/as façamos do nosso local de dentro da Ordem do Discurso (agora talvez entenda a dor do Foucault em sua conferência) um instrumento para transformar, transbordar e trans-bordar uma nova realidade social. Como disse Clarice Lispector outrora em um conto “Se você fosse você, o que faria?”.

Conheça "A cor da cultura"

"A Cor da Cultura é um projeto educativo de valorização da cultura afro-brasileira, fruto de uma parceria entre o Canal Futura, a Petrobras, o Cidan - Centro de Informação e Documentação do Artista Negro, a TV Globo e a Seppir - Secretaria especial de políticas de promoção da igualdade racial. O projeto teve seu início em 2004 e, desde então, tem realizado produtos audiovisuais, ações culturais e coletivas que visam práticas positivas, valorizando a história deste segmento sob um ponto de vista afirmativo."

Conheça mais acessando:http://www.acordacultura.org.br/

segunda-feira, 21 de abril de 2014

O impacto do racismo na infância


Como uma pessoa se torna preconceituosa? Como uma pessoa se torna racista? Todas as crianças nascem "zeradas" em termos de pensamento ou comportamento de segregação, mas, com o passar do tempo, dependendo de influências ou vivências, podem acumular um volume de lógicas e raciocínios que redundam no não reconhecimento do outro, quando este outro é de raça ou cor diferente da sua. Pais, parentes e professores, pelo papel que têm na formação da criança, são responsáveis para que um cidadão aprenda a respeitar, desde cedo, a diversidade étnico-racial.

Mesmo a prática do racismo sendo crime inafiançável e imprescritível, segundo a Constituição de 1988, em seu art. 5º - inc. XLII, ainda assim é comum assistirmos falas e declarações de conteúdo racista como algo "comum" em tom de brincadeira, ou de piadas. Isso tem se reproduzido de geração a geração e passado de pai para filho, como se fosse um costume de família. Dessa forma "natural", em tom de brincadeira, poucos assumem o preconceito, mas os efeitos na formação de uma criança são concretos: ela passa a não compreender a riqueza da diferença e a igualdade dos direitos entre as pessoas. São impactos visíveis na vida de crianças e adolescentes negros, indígenas e brancas.

O como agência da ONU que tem a missão de defender direitos de crianças e adolescentes, lança, dia 29 de novembro, uma campanha em nível nacional para alertar sobre o impacto do racismo na vida de milhões de crianças e adolescentes e contribuir para promover iniciativas que contribuam com a redução das disparidades. No Rio Grande do Norte, o lançamento acontece dia 30 de novembro, na Assembléia Legislativa.

Os números falam por si. No Brasil vivem 31 milhões de crianças negras e 160 mil indígenas, ou seja, 54,5% das crianças são negras ou indígenas. Um dado que assusta e que revela as disparidades: 65% das crianças pobres são negras. Quando se analisam números da mortalidade infantil, de crianças fora da escola ou de mortes de adolescentes negros, fica ainda mais explícita a necessidade de alertar a sociedade e mobilizar para que sejam asseguradas a equidade e a igualdade étnico-racial desde a infância.

A campanha sobre o racismo na infância foi desenvolvida com o objetivo de contribuir para rever o imaginário, principalmente quebrar a comodidade da falsa afirmação de que não existe racismo no Brasil; ajudar a promover o respeito entre as pessoas e práticas que combatam a discriminação, colaborando para a afirmação das identidades de crianças indígenas, negras e brancas.

Entre os resultados esperados, está o aumento do reconhecimento sobre os efeitos do racismo na vida de crianças e adolescentes e da valorização de direitos, identidades e da diversidade cultural. Em nível de políticas públicas, o que se espera é a formulação e implementação de ações voltadas para a redução das disparidades na educação, saúde e proteção dos direitos.

O conceito de equidade, ou seja, a disposição para que o direito do outro seja reconhecido de forma imparcial e igualitária, é o que move a campanha. E é o que se espera que seja percebido como valor a ser cultivado na educação de crianças e adolescentes, para que gerações de crianças e adolescentes negros e indígenas, que passaram séculos à margem de políticas públicas, sejam efetivamente reconhecidos na categoria de sujeitos de direitos.

Fonte: Geledés Instituto da Mulher Negra